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O advogado e radialista Nelson Carneiro é um dos mais atuantes comunicadores da região leste fluminense, especialmente em São Gonçalo. Com uma história marcada pela luta da democratização dos meios de comunicação, nos conta nesta entrevista que sofreu um baque com o fechamento arbitrário da Rádio Evidência em 2006 pela Anatel, ano em que comemorava grande audiência do seu programa "Sua Cidade e Seus Valores", atualmente no ar todos os sábados na Fluminense 540 AM, das 10 às 12 horas.
Contundente e sem papas na língua, acusa o PT de ter traído sua promessa de facilitar as concessões de rádios e tvs comunitárias no Brasil, facilitando a outorga para uns poucos, e dificultando para outros muitos. Ele cita textualmente duas figuras notórias do partido em São Gonçalo, o ex-vereador Miguel Moraes e o então dirigente Jairo Passos, hoje desfiliado da legenda. O jornal Daki desde já abre espaço para os citados nesta entrevista. Vamos a ela.
Jornal Daki
O Brasil vive num sistema capitalista mas a comunicação é altamente concentrada pela grande mídia. Na sua opinião a que se deve isso?
Nelson CarneiroNão podemos negar que os veículos de comunicação, no Brasil, estão nas mãos das pessoas mais ricas e, neste particular, citamos, por exemplo, o sistema globo de televisão que pertence aos herdeiros de Irineu Marinho e o SBT de propriedade do Senhor Abravanel que tem o nome artístico de Silvio Santos.
Às vezes colocamos o capital como o principal responsável pela distorção da mídia e nos esquecemos de que as outorgas ou as concessões do funcionamento dos Órgãos de transmissão, de som e imagem, são dadas pelo Poder Público, já que os jornais, pasquins e revistas, tem outro procedimento na sua instituição.
O poder público, por exemplo, autoriza o funcionamento de uma Rádio ou de uma TV comercial em determinada cidade e os seus estúdios estão em outro Município. Esse fato burla o que disciplina o artigo 221 da Constituição Federal que tem por objetivo incluir, em geral, entre as programações da emissora comercial, a produção de matérias de interesse local, ou seja, da cidade sede da outorga.
Nesse particular se conclui que há um rigor no momento na concessão, das emissoras de Rádio e de TV, mas não existe uma fiscalização pós-outorga, do poder concedente, para saber se a emissora está ou não desempenhando o fim precípuo da comunicação.
Dentro dessa situação, guardadas as devidas proporções, podemos afirmar que existe a meia culpa no mau funcionamento da comunicação de massa, neste País, entre o outorgante e o outorgado.
Você teve um caso traumático com a Rádio Evidência que foi fechada e junto o programa SUA CIDADE E SEUS VALORES. Pode nos contar o que e como aconteceu?.
Não diria traumático, mas, sim, uma quebra da continuidade de uma comunicação isenta que se fazia no Município de São Gonçalo. A Rádio Evidência ficava sediada no Bairro da Trindade, tinha endereço definido e possuía o seu equipamento documentado, porém, funcionava com o protocolo do seu pedido de legalização junto ao Ministério das Comunicações. Tinha uma programação eclética, de qualidade, e produzida in loco.
A sua audiência era maciça e atendia a todos os interesses dos segmentos sociais da cidade. A emissora funcionou oito anos e de repente com a chegada da esquerda ao poder, a emissora foi fechada a pretexto de ser uma rádio pirata e que a sua frequência estava interferindo na comunicação aérea.
Foi estranho que ANATEL e a PF não tenham, antes, se inteirado da importância do funcionamento daquela emissora para os gonçalenses e tenham se voltado contra uma ferramenta que perseguia a sua legalização enquanto, muitas outras, continuaram funcionando que nem pedido de legalização possuíam à época. Foi um processo de fechamento sumário, abrupto, que humilhou a todos e, pelo que se sabe, o seu Diretor além de perder os seus equipamentos ainda foi processado, criminalmente, perante a Justiça Federal.
Seria muita falta de modéstia da minha parte dizer que o Programa SUA CIDADE E SEUS VALORES tenha sido o responsável pelo processo de fechamento da emissora, mas já que foi citado pelo entrevistador, posso informar que a emissora foi lacrada, entre quinze e vinte dias, após a entrevista com o Deputado Federal, pelo Pará, João Batista Araújo, o BABÁ, criticando o governo petista, momento em que se dava a cisão e a debandada de parte da militância para a formação do PSOL.
Apesar de dar espaço aos integrantes do PT local, se não me falha a memoria, ao Jairo Bezerra Passos e ao Minguel Moraes, no sábado seguinte, para desfazerem qualquer informação errônea do Deputado BABÁ não foi o bastante porque pairava, naquele momento, a impressão de que a esquerda, mandava e desmandava, a “manu militari”, no País.
O programa SUA CIDADE E SEUS VALORES continuou vivo, foi ocupar espaço numa TV a cabo, mas os companheiros que enalteceram a legitimidade da ANATEL e da Polícia Federal pelo fechamento da emissora continuaram e continuam frequentando a nossa programação, porém, a Rádio Evidência, como ferramenta que interagia entre a população e as autoridades, continua fechada e houve um retrocesso na comunicação da radiodifusão em São Gonçalo apesar da esquerda ter chegado ao poder prometendo a ampliação da liberdade de expressão e a popularização da comunicação.
Em sua opinião, o que deve ser feito para termos uma comunicação mais plural, diversificada e democrática? Como você vê o advento das redes sociais na comunicação?
Para pluralizar a comunicação, os políticos que ai estão deviam cumprir a promessa de ampliar o processo das concessões de Rádio de TV, sem privilegiar o capital mas não é isso que presenciamos. Enquanto ficar estabelecido nas licitações quem pagar mais leva a outorga, tudo vai continuar como aí está, um pool de rádios e tv’s nas mãos dos mesmos.
A concessão do funcionamento das Rádios Comunitárias neste País chega a ser uma piada. O seu sinal fica restrito ou limitado a um raio de ação de mil e quinhentos metros e essa potência tem quer ampliada. Não podem fazer propaganda comercial e a direção da emissora fica de pires nas mãos, para conseguir recursos para a manutenção da emissora enquanto o Governo gasta montanha de dinheiro, com pacotes de publicidade, com as emissoras comerciais. Com essa falta de apoio do Governo no fortalecimento das Rádios e TV’s comunitárias, nem a longo prazo teremos uma comunicação plural porque há um desiquilíbrio entre os incentivos dados às emissoras comerciais e às comunitárias.
Com a nova tecnologia a televisão até pode, mas o Rádio jamais será substituído como ferramenta da informação em tempo real. Na minha modesta visão a internet veio para corrigir o desequilíbrio na comunicação. As redes sociais, como uma ferramenta moderna, tem tido uma importância significativa no meio social. As mudanças são visíveis na relação entre as autoridades e o povo.
Ninguém percebeu ainda que a comunicação não se faz só pelo “glamour” da imagem ou pela beleza da voz do locutor, mas, sim, pelo simples gesto de alguém estendendo o seu polegar, para cima ou para baixo, como sinal de positivo ou negativo.
Se a comunicação é tão simples assim, porque vamos comprimi-la nas mãos dos poderosos? Concluo dizendo que as redes sociais chegaram em boa hora porque veio dar voz a quem nunca teve.
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